As relações espaço-temporais nas narrativas de crianças
um olhar para o funcionamento dialógico do discurso
DOI:
https://doi.org/10.14393/DLv19a2025-35Palavras-chave:
Narrativas, Relações espaço-temporais., Dispositivo narrativo, Aquisição da linguagemResumo
Este artigo tem por objetivo refletir sobre o papel das relações espaço-temporais estabelecidas nas narrativas produzidas por uma criança na faixa etária dos 3 anos de idade, durante a situação de afastamento social provocada pela pandemia de Covid-19. Para tanto, busca-se apoio teórico-metodológico na perspectiva dialógico-discursiva da aquisição da linguagem, com destaque para a concepção de funcionamento dialógico do discurso narrativo. Os dados analisados neste artigo são constituídos por enunciados de uma criança produzidos em situações de diálogo espontâneas e analisados à luz de um dispositivo narrativo, uma proposição autoral, o qual considera os seguintes conceitos: movimentos da criança entre discursos, relações de tempo e espaço na dinâmica narrativa e representação de mundos. Esses conceitos se integram para, à luz da concepção dialógico-discursiva, contribuir para a compreensão da especificidade da narrativa produzida pela criança em sua trajetória de aquisição da linguagem. Nessa especificidade, os arranjos discursivos encontram, nas formas e sentidos da língua e nas manifestações corporais, elementos constitutivos do dizer. Os resultados da análise realizada apontam para o papel organizador da dinâmica narrativa derivado das relações espaço-temporais estabelecidas pela criança no discurso produzido. A organização da narrativa da criança revela, assim, um modo de funcionamento da linguagem no qual a transitoriedade entre representações de mundos se dá a partir de arranjos decorrentes do entrecruzamento das relações de tempo e espaço. Esses arranjos são concebidos como complexas relações espaço-temporais constituídas na vivência de aquisição da linguagem da criança e que lhe permitem a ampliação da experiência construída com os acontecimentos reais ou imaginários, o que se dá a partir da propriedade simbólica da linguagem, manifestada nos eventos narrados. Para tanto, contribuem os diferentes discursos vivenciados pela criança ao longo de sua trajetória na linguagem e que lhe permitem a construção do seu próprio dizer, na constituição humana de sujeito falante.
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