O desterro da memória e outras invenções em O último voo do flamingo
DOI:
https://doi.org/10.14393/LL64-v31n1a2015-15Palavras-chave:
Memória, identidade, cultura, ficção.Resumo
A preservação da memória e a materialização do passado por meio de várias formas de representações têm se mostrado preocupações que emergiram com os estudos culturais e parecem ser marcas deste século. A tentativa de musealização de um tempo que pode se perder demonstra, entre outras coisas, um certo pavor que adquirimos não apenas de esquecer os fatos que nos trouxeram até este presente confuso e culturalmente complexo, mas, sobretudo, de esquecer o que nos identifica culturalmente, o que nos descreve e justifica. Essa necessidade de vislumbrar uma narrativa linear não raramente valida discursos forjados nos interesses ideológicos de determinados grupos que se utilizam de seu espaço privilegiado para moldar uma história cuja face quase sempre se mostra irreconhecível para os sujeitos nela implicada. Contudo, em seu romance O último voo do flamingo, o escritor Mia Couto ilustra um processo que contraria essa lógica e nos aponta, por entre as vias limítrofes que se abrem entre discursos históricos e ficcionais, que, muitas vezes, é necessário esquecer para lembrar, propondo uma arqueologia da memória e, consequentemente, da identidade. Esse projeto aponta para a possibilidade de comtemplar, através de um esquecimento seletivo, os discursos e as narrativas tendenciosas e devoradoras de identidades, que, disfarçadas de memórias, produzem uma realidade de exclusão e de apagamento cultural e identitário.
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