O SENTIDO E O CAOS
existe diferença entre memes e shitposts na cultura da internet?
DOI:
https://doi.org/10.14393/DLv19a2025-70Palavras-chave:
Internet, Gênero, Linguagem, Memes, ShitpostsResumo
O artigo examina como memes e shitposts, dois produtos amplamente difundidos na cultura digital, diferenciam-se a partir de seus modos de enunciação, considerando suas características estruturais, comportamentais e comunicativas. O estudo tem por objetivo propor uma distinção técnica fundamentada na teoria de Mikhail Bakhtin sobre enunciado, enunciação e gêneros discursivos, articulando esses conceitos às formas multimodais e miméticas que caracterizam a circulação de conteúdos humorísticos na internet. A pesquisa adota abordagem qualitativa e natureza exploratória, buscando interpretar fenômenos comunicativos complexos e ainda pouco sistematizados no campo acadêmico. Para isso, reúne bibliografia especializada sobre memes, comportamento memético e cultura participativa, além de estudos que abordam o shitpost sob perspectivas estéticas, socioculturais e comparativas. A metodologia inclui análise teórico-conceitual e observação de exemplos representativos, permitindo compreender como cada formato opera em termos de composição visual, relação com o contexto e efeitos de sentido. Os resultados indicam que memes e shitposts compartilham comportamentos miméticos, replicando e transformando elementos visuais e discursivos presentes nos pools culturais digitais. No entanto, divergem profundamente na relação que estabelecem com o contexto dialógico. Os memes configuram enunciados-sentido: respondem a situações específicas, dialogam com acontecimentos, representam posicionamentos e preservam coerência temática e comunicativa. Já os shitposts se constituem como enunciados-ruído: produzem humor pela ausência deliberada de sentido, pelo caos visual e textual, pela quebra de expectativa e pela interrupção do fluxo comunicativo, desviando a atenção do contexto e tornando sua intencionalidade opaca ao interlocutor. Embora preservem a replicabilidade e a transformação típicas do comportamento memético, os shitposts operam por desconexão, abstração e choque. Com base nesses achados, o artigo conclui que o shitpost pode ser compreendido como um subgênero do meme, pois mantém sua estrutura replicável, mas subverte sua função comunicativa ao deslocar o enunciado para o domínio do nonsense. A diferenciação proposta contribui para o aprofundamento das discussões sobre gêneros digitais e evidencia como sentidos e ruídos participam da construção do humor na cultura da internet. Além disso, abre caminhos para investigações futuras sobre os impactos desses formatos na comunicação contemporânea e na evolução das práticas de linguagem mediadas digitalmente.
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