Uso de psicofármacos por docentes em licença psiquiátrica: um estudo em Goiânia
Conteúdo do artigo principal
Resumo
Este artigo tem como foco dramas singulares de adoecimento, relatando a investigação do processo de medicalização social/medicamentalização com psicofármacos, do afastamento do trabalho por transtornos psiquiátricos e de sua relação com a convivência escolar e com o trabalho docente, com base na psicologia histórico-cultural e na clínica da atividade. Em um corpus no qual predominam as depressões como motivo de afastamento do trabalho, os resultados da pesquisa em 109 prontuários de professores afastados por transtornos psiquiátricos (cedidos pela Junta Médica Municipal de Goiânia) mapeiam o amplo uso de drogas antidepressivas e ansiolíticas, com maior frequência do uso de clonazepam, fluoxetina e sertralina, sendo comum o consumo de psicofármacos em associação. A despeito das limitações dos registros pesquisados, observou-se que o tratamento buscado pelos professores é sobretudo medicamentoso, confirmando-se, pois, a medicalização do cuidado, em detrimento de uma abordagem integral do sujeito em seu drama de adoecimento singular. Identificamos sinais de presenteísmo laboral e repercussões negativas do uso dos psicofármacos na convivência escolar e trabalho dos professores, à revelia de uma abordagem da própria relação entre trabalho e adoecimento, emergente nos dramas de adoecimento. Nossas conclusões ratificam as observações de Whitaker (2017) acerca da estreita conexão entre cronificação e consumo de psicofármacos, enfatizando a necessidade de promover políticas e intervenções para o acompanhamento da saúde integral dos docentes em suas múltiplas determinações, bem como da restauração do papel do trabalho como operador da saúde, desenvolvimento e criatividade humana.
Detalhes do artigo
Seção

Este trabalho está licenciado sob uma licença Creative Commons Attribution-NonCommercial-NoDerivatives 4.0 International License.
Como Citar
Referências
ANDRADE, L. R. M. de; FALCÃO, J. T. da R. Trabalho docente no município de Natal: perfil e risco psicossocial. Educação & Sociedade, [s. l.], v. 39, p. 704–720, 2018. DOI: https://doi.org/10.1590/ES0101-73302018180935.
ANDRADES-MOYA, J. Convivencia escolar en Latinoamérica: una revisión bibliográfica. Revista Electrónica Educare, [s. l.], v. 24, n. 2, p. 1–23, 2 abr. 2020. DOI: https://doi.org/10.15359/ree.24-2.17.
APEOESP. A saúde dos professores. São Paulo: Cepes/APEOESP, 2012. Disponível em: http://www.apeoesp.org.br/d/sistema/publicacoes/390/arquivo/1-saude-dos-professores.pdf. Acesso em: 15 jun. 2014.
ASSUNÇÃO, A. Á.; OLIVEIRA, D. A. Intensificação do trabalho e saúde dos professores. Educação & Sociedade, [s. l.], v. 30, p. 349–372, 2009. DOI: https://doi.org/10.1590/S0101-73302009000200003.
BATISTA, J. B. V.; CARLOTTO, M. S.; MOREIRA, A. M. Depressão como causa de afastamento do trabalho: um estudo com professores do ensino fundamental. Psico, v. 44, n. 2, 2013. Disponível em: https://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/revistapsico/article/view/11551.
BONONI, A. S. S.; REIS, C. E. dos. A relação entre adoecimento psíquico e presenteísmo: a realidade de algumas escolas do interior de São Paulo. Caderno Pedagógico, [s. l.], v. 22, n. 9, p. e18732–e18732, 31 jul. 2025. DOI: https://doi.org/10.54033/cadpedv22n9-476.
BRASIL. Uso de medicamentos e medicalização da vida: recomendações e estratégias. Brasília: Ministério da Saúde, 2019.
BUSSAB, W. O.; MORETTIN, P. A. Estatística básica. São Paulo: Saraiva, 2013.
CLOT, Y. Trabalho e poder de agir. Belo Horizonte: FabreFactum, 2010.
CORDIOLI, A. V.; GALLOIS, C. B.; ISOLAN, L. Psicofármacos: consulta rápida. Porto Alegre: Artmed, 2015.
CÔRTES, M. Diabo e fluoxetina: pentecostalismo e psiquiatria na gestão da diferença. Curitiba: Appris, 2017.
DANZIGER, K. Where history, theory, and philosophy meet: the biography of psychological objects. In: HILL, D. B.; KRAL, M. J. (org.). About psychology: essays at the crossroads of history, theory and philosophy. [S. l.]: New York University Press, 2003. p. 19–33. Disponível em: https://psycnet.apa.org/record/2003-00339-002. Acesso em: 24 set. 2025.
DOMITROVIC, N.; CALIMAN, L. V. As controvérsias sócio-históricas das práticas farmacológicas com o metilfenidato. Psicologia & Sociedade, 2018, v. 29. DOI: https://doi.org/10.1590/1807-0310/2017v29163163.
FARAONE, S. et al. Discurso médico y estrategias de marketing de la industria farmacéutica en los procesos de medicación de la infancia en Argentina. Interface - Comunicação, Saúde, Educação, v. 14, p. 485–498, 2010. DOI: https://doi.org/10.1590/S1414-32832010005000002.
FAVA, G. A. May antidepressant drugs worsen the conditions they are supposed to treat? The clinical foundations of the oppositional model of tolerance. Therapeutic Advances in Psychopharmacology, v. 10, p. 2045125320970325, 2 nov. 2020. DOI: https://doi.org/10.1177/2045125320970325.
FERREIRA, A. A. L.; JACÓ-VILELA, A. M.; PORTUGAL, F. T. História da psicologia: rumos e percursos. [S. l.]: NAU Editora, 2013.
FERREIRA, T. V. Saúde do professor: uso de medicamentos por professores da rede estadual de educação de Rio Verde/Goiás. 2016. Dissertação (Mestrado em Saúde Coletiva) – Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2016.
INSFRAN, F. F. N.; LADEIRA, T. A. “Remédios? Eu tomo vários”: adoecimento e medicalização docente no interior do estado do Rio de Janeiro. In: FACCI, M.; CUNHA URT, S. (org.). Quando os professores adoecem: demandas para a psicologia da educação. Campo Grande: UFMS, 2020.
LEÃO, A. L. de M.; BARBOSA-BRANCO, A.; RASSI NETO, E.; RIBEIRO, C. A. N.; TURCHI, M. D. Absenteísmo-doença no serviço público municipal de Goiânia. Revista Brasileira de Epidemiologia, v. 18, n. 1, p. 262–277, 2015. DOI: https://doi.org/10.1590/1980-5497201500010020.
LECCA, I. M. B.; MARIN, H. M. T. Convivencia escolar: una revisión bibliográfica. Ciencia Latina Revista Científica Multidisciplinar, v. 6, n. 1, p. 1291–1304, 2 fev. 2022. DOI: https://doi.org/10.37811/cl_rcm.v6i1.1579.
LIMA, M. E. A. Saúde mental e trabalho: limites, desafios, obstáculos e perspectivas. Cadernos de Psicologia Social do Trabalho, v. 16, n. spe1, p. 91, 2013. DOI: https://doi.org/10.11606/issn.1981-0490.v16ispe1p91-98.
MARIANO, T. O.; CHASIN, A. A. Drogas psicotrópicas e seus efeitos sobre o sistema nervoso central. Revista Acadêmica Oswaldo Cruz, ano 6, 2019. https://oswaldocruz.br/revista_academica/content/pdf/Edicao_22_TAIS_OLIVEIRA_MARIANO.pdf.
ROSA, J. S.; TOASSA, G.; SEPTIMIO, A. L. D. M.; AQUINO, P. M. D.; SILVA, K. G. D. Relação professor-aluno e o drama da psiquiatrização docente: um estudo a partir de dados do município de Goiânia. Educação em Revista, v. 40, p. e42679, 2024. DOI: https://doi.org/10.1590/0102-469842679.
SEPTIMIO, A. L. de M.; TOASSA, G.; ROSA, J. S. Conflitos na relação professora-chefia e o drama da psiquiatrização docente: um estudo a partir de dados do município de Goiânia. Obutchénie. Revista de Didática e Psicologia Pedagógica, p. 1–24, 22 dez. 2023. DOI: https://doi.org/10.14393/OBv7n3.a2023-72098.
SEGAT, E.; DIEFENTHAELER, H. S. Uso de medicamentos antidepressivos por professores de escolas de diferentes redes de ensino em um município do norte do Rio Grande do Sul. Perspectiva, v. 37, n. 137, p. 45–54, 2013. https://www.uricer.edu.br/site/pdfs/perspectiva/137_324.pdf.
SILVA, C. O. D.; RAMMINGER, T. O trabalho como operador de saúde. Ciência & Saúde Coletiva, v. 19, n. 12, p. 4751–4758, dez. 2014. https://doi.org/10.1590/1413-812320141912.15212013.
SOARES, M. M.; OLIVEIRA, T. G. D.; BATISTA, E. C. O uso de antidepressivos por professores: uma revisão bibliográfica. Revista de Educação da Universidade Federal do Vale do São Francisco, v. 7, n. 12, 2017. https://periodicos.univasf.edu.br/index.php/revasf/article/view/25.
TOASSA, G. É possível o “domínio dos afetos” no trabalho docente? Considerações a partir de Espinosa e Marx. Filosofia e Educação, v. 5, n. 1, p. 130–155, 2013. https://doi.org/10.20396/rfe.v5i1.8635413.
TOASSA, G. Vigotski: notas para uma psicologia geral e concreta das emoções/afetos. Cadernos Espinosanos, v. 30, p. 49–66, 2014.
TOASSA, G.; SILVA, K. G. Absenteísmo-doença e trabalho de professores do município de Goiânia: um estudo com licenças psiquiátricas. Revista Psicologia Escolar e Educacional (no prelo)
VEDOVATO, T. G.; MONTEIRO, M. I. Perfil sociodemográfico e condições de saúde e trabalho dos professores de nove escolas estaduais paulistas. Revista da Escola de Enfermagem da USP, v. 42, n. 2, p. 291–297, 2008. DOI: https://doi.org/10.1590/S0080-62342008000200012.
VIGOTSKI, L. S. Manuscrito de 1929. Educação & Sociedade, v. 21, n. 71, p. 21–44, 2000. https://www.scielo.br/j/es/a/hgR8T8mmTkKsNq7TsTK3kfC/?lang=pt.
WHITAKER, R. Anatomia de uma epidemia: pílulas mágicas, drogas psiquiátricas e o aumento assombroso da doença mental. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2017.