O historiador como fotógrafo da morte: uma leitura de Histórias que só existem quando lembradas
DOI:
https://doi.org/10.14393/artc-v22-n40-2020-56971Palavras-chave:
Histórias que só existem quando lembradas, fotografia, escrita da históriaResumo
Tomando como objeto de análise o filme Histórias que só existem quando lembradas, lançado em 2012 e dirigido por Júlia Murat, este artigo propõe uma reflexão sobre o fotógrafo como metáfora do papel do historiador. Tal como a fotógrafa recém-chegada na cidade imaginária de Jotuomba, na qual um conjunto pequeno de moradores desenvolve suas atividades diárias apagando completamente a passagem do tempo, é possível compreender o historiador como aquele que se utiliza de rastros e vestígios para a construção de imagens por meio das quais os sujeitos podem entrar em choque com o seu passado, de modo semelhante à concepção benjaminiana sobre a noção de rastros e sobre a produção de imagens dialéticas. Esse choque, como instantâneo que se configura na tensão entre o recalcado e os desejos que tornam qualquer relação com imagens do passado anacrônica, pode ser libertador do peso de um passado que se acumula, de forma anódina e previsível, nas repetições do cotidiano, por intermédio de gestos, ritos, objetos, frases clichês, enfim, de uma vivência que se esqueceu (ou recalcou) da própria passagem do tempo.
Downloads
Referências
ASSMANN, Aleida. Espaços da recordação: formas e transformações da memória cultural. Campinas: Unicamp, 2011.
BARTHES, Roland. L'effet de réel. In: BARTHES, Roland et al. (orgs.). Littérature et réalité. Paris: Seuil, 1982.
BARTHES, Roland. Michelet. São Paulo: Companhia das Letras, 1991.
BARTHES, Roland. A câmara clara: notas sobre a fotografia. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2015.
BENJAMIN, Walter. Paris do Segundo Império. In: Charles Baudelaire: um lírico no auge do capitalismo. São Paulo: Brasiliense, 1989.
BENJAMIN, Walter. A imagem de Proust. In: Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura. São Paulo: Brasiliense, 1994.
BENJAMIN, Walter. O narrador: considerações sobre a obra de Nikolai Leskov. In: Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura. São Paulo: Brasiliense, 1994.
BENJAMIN, Walter. Pequena história da fotografia. In: Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura. São Paulo: Brasiliense, 1994.
BERGSON, Henri. A evolução criadora. São Paulo: Martins Fontes, 2005.
BERGSON, Henri. Matéria e memória: ensaio sobre a relação do corpo com o espírito. São Paulo: Martins Fontes, 2006.
BLANCHOT, Maurice. A literatura e o direito à morte. In: A parte do fogo. Rio de Janeiro: Rocco, 1997.
BLANCHOT, Maurice. A obra e o espaço da morte. In: O espaço literário. Rio de Janeiro: Rocco, 2011.
CANDAU, Joël. Memória e identidade. São Paulo: Contexto, 2011.
CATROGA, Fernando. O céu da memória: cemitério romântico e culto cívico dos mortos em Portugal (1756-1911). Coimbra: Minerva, 1999.
CONNERTON, Paul. Como as sociedades recordam. Lisboa: Celta, 1999.
DELEUZE, Gilles. Bergsonismo. São Paulo: Editora 34, 2012.
DIDI-HUBERMAN, Georges. De semelhança a semelhança. Alea: Estudos Neolatinos, v. 13, n. 1, Rio de Janeiro, jan.-jun. 2011.
DIDI-HUBERMAN, Georges. O que vemos, o que nos olha. São Paulo: Editora 34, 2014.
DIDI-HUBERMAN, Georges. Abrir os campos, fechar os olhos. Imagem, história, legibilidade. In: Remontagens do tempo sofrido: o olho da história, II. Belo Horizonte: Editoria UFMG, 2018.
DRAAISMA, Douwe. Metáforas da memória: uma história das ideias sobre a mente. Bauru: Edusc, 2005.
FOUCAULT, Michel. O corpo utópico, as heterotopias. São Paulo: n-1 Edições, 2013.
FREUD, Sigmund. Recordar, repetir e elaborar (Novas recomendações sobre a técnica da psicanálise II) (1914). In: O caso Schreber, artigos sobre técnica e outros trabalhos (1911-1913). Rio de Janeiro: Imago, 1996 (Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud, 12).
GAGNEBIN, Jeane Marie. Prefácio – Walter Benjamin ou a história aberta. In: BENJAMIN, Walter. Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura. São Paulo: Brasiliense, 1994.
GINZBURG, Jaime. A interpretação do rastro em Walter Benjamin. In: SEDLMAYER, Sabrina e GINZBURG, Jaime. Walter Benjamin: rastro, aura e história. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2012.
HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. São Paulo: Vértice, 1990.
JULIEN, Philippe. O estranho gozo do próximo: ética e psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar, 1996.
LACAN, Jacques. Seminário sobre “A carta roubada”. In: Escritos. São Paulo: Perspectiva.
LAPOUJADE, David. Potências do tempo. São Paulo: n-1 Edições, 2010.
LAVABRE, Marie-Claire. Du poids et du choix du passé: lecture critique du ‘Syndrome de Vichy’. In: PESCHANSKI, Denis, POLLAK, Michael e ROUSSO, Henry. Histoire politique et sciences sociales. Bruxelles: Complexes, 1991.
LEFORT, Claude. Essais sur le politique (XIXe-XXe siècles). Paris: Seuil, 1986.
LISBOA, Henriqueta. Vem, doce morte. In: Flor da morte. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2004.
LOWENTHAL, David. Como conhecemos o passado. Projeto História, v. 17, São Paulo, set. 2012.
MARCELINO, Douglas Attila. Experiências primárias e descontinuidades da recordação: notas a partir de um texto de Reinhart Koselleck. Tempo & Argumento, v. 8, n. 19, Florianópolis, set.-dez. 2016.
MARCELINO, Douglas Attila. Tempo do evento, poética da história: maio de 1968 segundo Michel de Certeau e Cornelius Castoriadis. História da Historiografia, v. 12, n. 30, Ouro Preto, ago. 2019.
MURAT, Júlia. Histórias que só existem quando lembradas, Brasil/Argentina/França, Taiga Filmes, 2011, DVD (108m).
PROUST, Marcel. Em busca do tempo perdido. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2016, 3 v.
RANCIÈRE, Jacques. Les noms de l’histoire: essai de poétique du savoir. Paris: Seuil, 1992.
RANCIÈRE, Jacques. O efeito de realidade e a política de ficção. Novos Estudos Cebrap, v. 29, n. 1, São Paulo, mar. 2010.
RICOEUR, Paul. Le lectura del tiempo passado: memoria y olvido. Madrid: UAM /Arrecife, 1999.
RICOEUR, Paul. La mémoire, l’histoire, l’oubli. Paris: Seuil, 2000.
RICOEUR, Paul. Vivo até a morte seguido de fragmentos. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2012.
RICOEUR, Paul. O si-mesmo como outro. São Paulo: Martins Fontes, 2014.
SAHLINS, Marshall. Ilhas de história. Rio de Janeiro: Zahar, 2003.
SAMUEL, Raphael. Teatros da memória. Projeto História, n. 14, São Paulo, fev. 1997.
SARLO, Beatriz. Tempo passado: cultura da memória e guinada subjetiva. São Paulo-Belo Horizonte: Companhia das Letras/Editora UFMG, 2007.
SONTAG, Susan. Sobre a fotografia. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.
URBAIN, Jean-Didier. Deuil, trace et mémoire. Les Cahiers de Médiologie, n. 7, Paris, 1999/1. Disponível em <http://www.gallimard.fr/Catalogue/GALLIMARD/Revue-Les-cahiers-de-mediologie>.
VECCHI, Roberto e RIBEIRO, Margarida Calafate. A memória poética da guerra colonial de Portugal na África: os vestígios como material de uma construção possível. In: SEDLMAYER, Sabrina e GINZBURG, Jaime. Walter Benjamin: rastro, aura e história. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2012.
WORMS, Frédéric. Bergson ou os dois sentidos da vida. São Paulo: Editora Unifesp, 2010.
Downloads
Publicado
Como Citar
Edição
Seção
Licença
Autores que publicam nesta revista concordam com os seguintes termos da licença Creative Commons, adotada a partir da ArtCultura, v. 21, n. 39 (jul.-dez. 2019).
CC BY-NC-ND 4.0: o artigo pode ser copiado e redistribuído em qualquer suporte ou formato. Os créditos devem ser dados ao autor original e mudanças no texto devem ser indicadas. O artigo não pode ser usado para fins comerciais. Caso o artigo seja remixado, transformado ou algo novo for criado a partir dele, ele não pode ser distribuído.
Autores têm autorização para assumir contratos adicionais separadamente, para distribuição não exclusiva da versão do trabalho publicada nesta revista (ex.: publicar em repositório institucional ou como capítulo de livro), com reconhecimento de autoria e publicação inicial nesta revista.